segunda-feira, 21 de abril de 2025

PENSAMENTO GRACILIANO RAMOS * Partido Comunista dos Trabalhadores Brasileiros/PCTB

PENSAMENTO GRACILIANO RAMOS
Auto-retrato aos 56 anos

Nasceu em 1892, em Quebrangulo, Alagoas.
Casado duas vezes, tem sete filhos.
Altura 1,75.
Sapato n.º 41.
Colarinho n.º 39.
Prefere não andar.
Não gosta de vizinhos.
Detesta rádio, telefone e campainhas.
Tem horror às pessoas que falam alto.
Usa óculos.
Meio calvo.
Não tem preferência por nenhuma comida.
Não gosta de frutas nem de doces.
Indiferente à música.
Sua leitura predileta: a Bíblia.
Escreveu "Caetés" com 34 anos de idade.
Não dá preferência a nenhum dos seus livros publicados.
Gosta de beber aguardente.
É ateu. Indiferente à Academia.
Odeia a burguesia. Adora crianças.
Romancistas brasileiros que mais lhe agradam: Manoel Antônio de Almeida, Machado de Assis, Jorge Amado, José Lins do Rego e Rachel de Queiroz.
Gosta de palavrões escritos e falados.
Deseja a morte do capitalismo.
Escreveu seus livros pela manhã.
Fuma cigarros "Selma" (três maços por dia).
É inspetor de ensino, trabalha no “Correio do Manhã”.
Apesar de o acharem pessimista, discorda de tudo.
Só tem cinco ternos de roupa, estragados.
Refaz seus romances várias vezes.
Esteve preso duas vezes.
É-lhe indiferente estar preso ou solto.
Escreve à mão.
Seus maiores amigos: Capitão Lobo, Cubano, José Lins do Rego e José Olympio.
Tem poucas dívidas.
Quando prefeito de uma cidade do interior, soltava os presos para construírem estradas.
Espera morrer com 57 anos.

“Os dados biográficos é que não posso arranjar, porque não tenho biografia. Nunca fui literato, até pouco tempo vivia na roça e negociava. Por infelicidade, virei prefeito no interior de Alagoas e escrevi uns relatórios que me desgraçaram. Veja o senhor como coisas aparentemente inofensivas inutilizam um cidadão. Depois que redigi esses infames relatórios, os jornais e o governo resolveram não me deixar em paz. Houve uma série de desastres: mudanças, intrigas, cargos públicos, hospital, coisas piores e três romances fabricados em situações horríveis – Caetés, publicado em 1933, S. Bernardo, em 1934, e Angústia, em 1936. Evidentemente, isso não dá uma biografia. Que hei de fazer? Eu devia enfeitar-me com algumas mentiras, mas talvez seja melhor deixá-las para romances.”

Trecho de carta enviada em nov.1937 por Graciliano a Raúl Navarro, tradutor argentino, para ser anexado a um conto em vias de publicação em Buenos Aires
IN: Cartas inéditas de Graciliano Ramos a seus tradutores argentinos Benjamín de Garay e Raúl Navarro, p. 123, EDUFBA, 2008
Obras disponíveis
1949 - jan Prestes
1949 - jun Coisas da China

GRACILIANO RAMOS E O PARTIDO COMUNISTA

No dia 18 de agosto de 1945, exatamente 75 anos atrás, Graciliano Ramos se filiava ao Partido Comunista do Brasil, após uma conversa com Luiz Carlos Prestes em um voo a Belo Horizonte. O episódio é narrado na biografia do escritor, O VELHO GRAÇA, de Dênis de Moraes:
“Como era inevitável, a política entrou em pauta, e, assim que pôde, Prestes perguntou à queima-roupa:
– Graciliano, por que você ainda não é membro do partido?
– O que é que eu posso fazer no partido, Prestes? Eu não sei fazer outra coisa senão escrever. Não sei guerrear, porque minha arma é a pena.
Prestes respondeu:
– Você acha pouco? Pessoas como você, Portinari e Oscar Niemeyer são indispensáveis ao partido.
Ao retornar, Graciliano disse a Heloísa:
– Ló, eu fiquei tão espantado, porque nunca pensei que pudesse ter valia como militante.
Prestes abonou a ficha de filiação assinada por Graciliano na manhã de 18 de agosto de 1945.”
O VELHO GRAÇA: uma biografia de Graciliano Ramos, de Dênis de Moraes, com 20% de desconto em nossa loja virtual

O PARTIDO COMUNISTA

O meu prezado José Lins, romancista José Lins do Rego, teve há dias, em artigo da imprensa vespertina, um grito de sinceridade, natural no homem que forjou o Ciclo da Cana-de-Açúcar e a figura inesquecível de Vitorino Papa-Rabo. Esse grito deve ter ecoado — longe — e é inútil mencionar tudo quanto encerra o artigo, certamente lido com amargura e raiva por muito político vaidoso.

É a confissão espontânea de que o Partido a que se filia o escritor ruiu fragorosamente por ser uma confusa mistura de paixões e interesses diversos. Andou às "tontas", “sem contato com as massas” e, “num pleito livre, admirável espetáculo de civismo", perdeu em vinte e quatro horas todos os sonhos acariciados em longos meses de cegueira voluntária, cegueira que o autor de “Banguê ", depois dessa louvável franqueza, tenta inexplicavelmente prolongar.

Aí José Lins se embaraça em contradições. Afirma que só os comunistas têm um

“plano estabelecido, com palavras de ordem, firmeza de ação para determinar fins". "Esses homens são um bloco e rolam como um bloco sobre os fatos”.

Que devemos concluir? José Lins diz quatro vezes que essas forças batidas representam a democracia — asserção duvidosa — e conclui:

"or tudo isso, cada vez mais se faz urgente a fundação de um partido democrático que una o Brasil, que seja o verdadeiro amigo do povo, um complexo de ideias generosas, de compromissos com a dignidade humana, sem sectarismo, a bem de nossa terra e de nossa gente".

Reproduzi o período inteiro, a fim de notarmos a incongruência do nosso querido romancista.

Quem vai estruturar esse partido? Naturalmente os mesmos homens que se revelam agora incapazes, com certeza pouco dispostos a visitar favelas, pichar muros, viajar centenas de léguas para dizer quatro palavras a algumas dúzias de operários. Assevera José Lins que apesar de terem os "melhores propósitos, a consciência limpa", não conseguiram chegar às massas.

Como poderiam chegar? Não nos interessam os bons propósitos e a consciência limpa de certos privilegiados que rodam nos automóveis, infinitamente longe de nós. Basta que um desses cavalheiros, em momento de enjoo, se refira à canalha dos morros, à malta dos desocupados para se desvanecerem todos os bons propósitos. Vivem na superfície, reciprocam amabilidades, incham em demasia — e supõem que atrás deles há multidões emboscadas esperando milagres impossíveis. Nesse período citado integralmente, José Lins, depois de ter sido tão honesto, cai na demagogia e nas promessas vagas. Um partido que seja o verdadeiro amigo do povo, um complexo de ideias generosas, de compromissos com a dignidade humana. Linguagem diferente da linguagem ordinária do criador de “Fogo Morto". Palavras, nada mais.

Isso que José Lins deseja fundar, sem indicar os meios, já existe, segundo ele próprio declara:

"Só o Partido Comunista foi um órgão inteiriço em todo o território nacional."

Diabo! Não é suficiente? Ou será que não somos amigos do povo, não possuímos ideias generosas nem dignidade humana? José Lins não admite semelhante coisa. Observador por índole e por ofício, sabe perfeitamente isto, o único amigo do povo é o povo organizado; temos ideias bem claras, e as ideias generosas dos amigos da onça nos deixam de orelha em pé; a nossa dignidade é pouco mais ou menos igual à dos outros bichos que a humanidade produz.

Sinto discordar do meu velho amigo José Lins, grande cabeça e enorme coração. Discordo. Penso como Vitorino Papa-Rabo, notável sujeito que deixou de ser personagem de romance e a esta hora deve fazer discursos numa pequena célula remota, no interior da Paraíba.
GRACILIANO RAMOS

Nenhum comentário:

Postar um comentário